Há um momento na vida em que a gente para de perguntar “onde errei?” e começa a se perguntar: “ok, o que aprendi?”

Claramento não é um movimento simples. A gente passa tanto tempo tentando corrigir o passado que esquecemos que sempre fará parte da nossa construção. Cada decisão, mesmo aquelas que pareciam desajuste, bagunça, barulho, foi uma tentativa de cuidar de si, de movimento que nos faz olhar para segurança, afeto, pertencimento.

Apropriar-se da própria história não é sobre romantizar o que doeu, mas reconhecer que a dor também é parte da formação. Estamos falando aqui sobre recolher o que se perdeu no caminho e entender que ali também existia vida pulsando.

Winnicott dizia que ser autêntico é conseguir sustentar o que é verdadeiro em nós mesmo diante das expectativas, ou seja, sustentar o gesto que é só nosso, aquele que não precisa de aprovação pra existir.

Por muito tempo, aprendemos a caber nos moldes.

Por muito tempo, adaptamos demais.

Nos adaptamos às expectativas, aos cargos, aos modelos de sucesso que são impostos. Mas uma hora o corpo e o inconsciente pedem espaço. E é nesse instante que percebemos que não se trata de apagar o que foi, mas de integrar o que nos é verdadeiro em cada escolha que fizemos, se apropriar da história dando voz ao que ficou calado, ao que, por medo ou sobrevivência, foi silenciado.


Nesse resgate há um paradoxo que nos devolve potência quando deixamos de ser prisioneiros do que aconteceu e passamos a ser autores do que significou.

Paul Ricoeur dizia que somos o que contamos de nós mesmos, ou seja, a narrativa é a forma como o passado encontra o presente para criar futuro e quando recontamos nossa trajetória, mudamos o eixo: deixamos de ser personagens à deriva e nos tornamos narradores com consciência.

Talvez o emprego que acabou, a parceria que se desfez, o plano que não se concretizou e tudo isso, visto de perto, pareça ruína. Mas, com o tempo, a gente entende que eram capítulos necessários para o enredo seguir.


Cada ciclo fechado reorganiza o que vem depois e a clareza sobre o passado é o que nos permite escolher o que escrever no próximo parágrafo.

Apropriar-se da própria história é um ato de coragem e escolha.
Como diria Brené Brown, exige vulnerabilidade, o risco de ser visto por inteiro. Mas é também o que Viktor Frankl chamaria de liberdade última: a de escolher o sentido que damos às nossas experiências.

Quando paramos de medir a vida pelos resultados e começamos a honrar o processo, descobrimos algo simples e profundo onde nada do que vivemos foi em vão.
O que antes parecia erro agora se revela como treino de percepção.
O que antes era queda, agora é terreno fértil para reconstrução.

Talvez pessoal, apropriar-se da própria história seja isso: transformar carga em bagagem.
Carregar o que serve, deixar o que dói, e seguir sabendo que cada parte de nós tem algo a ensinar. A vida profissional não é uma linha reta, é uma travessia feita de escolhas conscientes, reencontros e reinterpretações. E o futuro que escolhemos só ganha consistência quando reconhecemos o chão que nos trouxe até aqui.

Porque, no fim, a história não precisa ser perfeita, a história precisa ser nossa.

Com escuta e movimento,

Thaís Pontin
Psicóloga | Fundadora da Senda | Head de Desenvolvimento na VES

Minha atuação acontece no espaço onde pessoas, carreiras e organizações se encontram: apoiando executivos, líderes, equipes e jovens talentos em jornadas que despertam consciência e geram impacto real.

Na clínica ou nas empresas, sigo a mesma missão: enxergar o indivíduo em sua totalidade — antes, além e para além do trabalho — reconhecendo sua essência, sua singularidade e sua potência.